Ruisinho:
- O país está em ruptura e, ou me engano muito, ou essa ruptura vai-se acentuar, transformando-se num braço de ferro entre o governo, que quer a Ota e o TGV, e todos os outros, excepção feita aos que têm interesses ligados a qualquer um desses projectos.
- Basta ler tudo quanto é imprensa e então, depois da demissão do ministro das Finanças e da intervenção, sobre este assunto, do Dr. António Vitorino, é aquilo a que se pode chamar de um fartar vilanagem. Grupos de economistas, dos mais conhecidos e prestigiados do país, vêem à televisão e vão para os jornais com abaixo assinados opondo-se aos investimentos e ameaçam mesmo, que qualquer dia, um delegado do governo irá bater à porta de cada família portuguesa para exigir a entrega da quota-parte da contribuição de cada um de nóspara aqueles dois investimentos, qualquer coisa como 1000 ou 1500 euros por cada elemento do agregado familiar.
- Eu que estava a pensar em fazer uma viagenzita com o reembolso de uma aplicação financeira que fiz há 8 anos atrás e que se vence proximamente vou ter que deixar tudo em suspenso. Depois dos 27 meses de guerra que fiz em Angola para aí há uns 40 anos atrás chegou a hora de um novo sacrifício pelo meu país. Com a diferença apenas que em 1962 a generalidade dos portugueses, os que tinham e os que não tinham opinião, mais estes do que aqueles, eram quase unanimemente a favor do sacrifício da guerra, pelo indiscutível direito que os Estados tinham de defender a integridade do território nacional fosse ele qual fosse estivesse ele onde estivesse.
- Mas agora não, o país está profundamente dividido, direi melhor, ao que parece, desequilibradamente dividido. Tirando o senhor 1º Ministro, e os Ministros da Economia e das Obras Públicas, todos as outras vozes ou se atiram aos investimentos em questão como “gato a bofe” ou levantam as suas dúvidas.
- Afirmo, em consciência, de que me considero um bom cidadão, daqueles que entendem, como o Presidente Kennedy entendia, que são os cidadãos que têm que se sacrificar pela nação e não o contrário. E por isso, como o país não são só personalidades políticas e economistas cujas opiniões já conhecemos porque têm sido divulgadas, informem-se os portugueses de uma forma clara e objectiva, das vantagens e inconvenientes dos investimentos em causa. O assunto não pode ser mais polémico do que o é neste momento. O manifesto subscrito pelos 13 eminentes economistas vai, certamente, colher o apoio, em peso, da oposição e o governo cometerá um autêntico suicídio político se entender que lhe basta argumentar com a legitimidade do seu poder para decidir, que efectivamente tem. A decisão sobre qualquer um destes projectos é de natureza política, sem dúvida, mas tem que ser tecnicamente fundamentada e a partir de agora muito bem explicada. Pela minha parte, como democrata, respeitarei a decisão e desistirei da tal viagem em favor da minha contribuição mas se não existir explicação e os resultados não contribuírem para melhorar a situação do país, mesmo que seja no longo prazo, não conte o PS com o meu voto em futuras eleições.
- De qualquer forma, o que me angustia é esta guerrilha permanente, esta tensão e incerteza em que estamos sempre mergulhados, esta dúvida sobre o nosso futuro colectivo, esta sensação de ingovernabilidade desesperante que nos faz adiar constantemente as esperanças no futuro, esta dificuldade, que é de todos nós, em gerarmos classes dirigentes responsáveis, sérias, competentes, sobre as quais não recaiam, permanentemente, dúvidas e suspeitas sobre as suas capacidades.
- Provavelmente, éramos mais felizes quando não tínhamos ambições, quando levávamos dois dias de Trás-os-Montes a Lisboa e mandávamos aparelhar o burro para as pequenas deslocações….ao menos tínhamos muito mais tempo para pensar, quem sabe, senão mesmo para sonhar… em viajar um dia num TGV e embarcar, na OTA, num avião para Paris.
Tio Quim