- Carta ao Pai Natal - Mário Soares
Pai Natal
Acordei agora da sesta. Tive um sonho original.
Conversei com a Maria
E achamos que não é sonho
Mas uma ideia genial!
Já fui ministro, primeiro-ministro
E duas vezes presidente deste país
Está na hora de mudar de ares
Aceitar novos desafios
Levar mais longe o nome de Portugal
Ou o meu nome… Como sempre quis.
Como tu tenho já uma certa idade
E no ventre a mesma proeminência
Decidi que para o ano quero ser o Pai Natal.
Portanto…
Olha pá faz as malas. Desocupa a Lapónia.
Vou ser eu o Pai Natal.
Tem lá paciência.
Assinado: Mário Soares
(Ex-deputado. Ex-Primeiro Ministro. Ex-Presidente da Republica. Ex-Deputado europeu. Futuro Pai Natal)
- Carta ao Pai Natal - Manuel Alegre
Pai natal quando voares nos céus da minha Pátria
Quando aterrares as renas nas planícies do meu País
Lembra-te desta carta, pedido singelo
De um homem que só para a Pátria pede
Para si… Nada quis.
Se o nevoeiro que levou D. Sebastião
Te fizer perder o rumo e baralhar o norte
Segue o cheiro a verde pinho
Ouve a minha trova no vento que passa
E chegarás às chaminés do meu país
Pátria desafortunada. Sem euros. Má sorte.
Numa das chaminés de Lisboa
Sentirás o odor e verás o fumo negro da traição
Que o teu trenó sobre ela paire
Que sobre a chaminé de Soares a tua rena pare
E solte bosta. Um imponente cagalhão.
Assinado: Manuel Alegre
- Carta ao Pai Natal - Francisco Louçã
Isto não é uma carta!
É um manifesto. Um protesto. Uma petição
Assinada por dezenas de intelectuais
E outras pessoas que jamais
Se reviram numa festa
Bacanal
Orgia de oferendas
Dadas sem qualquer critério
E que perpetuam uma tradição
Caduca. Reaccionária. Clerical.
Que tu representas oh pai do natal.
Com esta petição pretendemos
Que a data seja referendada
Não imposta, decretada
Por um estado economicista e liberal
E que seja celebrada quando um homem quiser
Não à roda da mesa. Consoada.
Mas num portuguesíssimo arraial.
Assina: Francisco Louça
- Carta ao Pai Natal - Aníbal Cavaco Silva
Excelentíssimo Senhor Doutor Pai Natal
Venho por esta via pedir para a minha Maria
O KamaSutra, versão condensada
Não sei se a minha Maria teria
Para a versão completa e ilustrada
Suficiente pedalada.
Eu para mim
Por ora nada peço
E de momento nada digo
Não abdico do meu direito de manter o suspense
E de fazer tabu do meu posterior pedido.
Mas…. E só isto adianto
Não preciso de Viagra
Para acompanhar a minha Maria na leitura
Do acima citado livro
Que teso e hirto ando eu sempre
Não precisando por isso de muleta
Ou qualquer outro suplemento
Para manter a rigidez
E o meu porte sobranceiro.
Despeço-me atentamente economizando palavras
Porque como vossa Excelência sabe:
Os tempos são de crise e tempo é dinheiro.
Assina o Professor Doutor: Cavaco Silva
- Carta ao Pai Natal - Jerónimo de Sousa
Camarada
Tu que és explorado pela entidade patronal
Durante a época do Natal
Usado como símbolo do capitalismo
Para fomentar o consumismo
Desenfreado, descontrolado
Que enriquece a burguesia
E empobrece o proletariado
Junta-te a nós no combate
Contra a guerra no Iraque
Oferece Che Guevara’s não ofereças Action Man’s
Luta pela igualdade feminina
Não dês Barbies mas Matrioshkas
Educa as crianças de hoje
Comunistas amanhã
Substitui o Harry Potter pelo livro “O Capital”.
Camarada
Reivindica o teu direito a um transporte decente
Pára o trenó e as renas
Que não é veículo de gente operária e trabalhadora
Como tu oh pai natal!
Unidos venceremos o imperialismo e os reaccionários
Viva o Natal dos oprimidos
Viva o Natal dos operários!
Assinado pelo candidato: Jerónimo de Sousa
(Carta aprovada por unanimidade e braço no ar pelo Comité Central do PCP)
PS:
Agradecemos ao Joaquim Marújo o amável envio destas imagens. Porque a caricatura é arte; porque a arte também é parte da vida e parte da verdade; toda a caricatura, antes de o ser, já foi verdade, menos exagerada - é certo!!! Mas verdade. Afinal, o que é a verdade - senão uma construção permanente e vigilante do nosso olhar.. Não há olhares neutros. Ou como diria o nosso grande Vergílio Ferreira: a verdade é um erro a aguardar vez. E em tudo aquilo há verdade e verdades. Mas a setença só será em Janeiro. Por vezes o povo engana-se..., e por vezesengana-se para pior. Logo, a grande ciência e a grande arte destas eleições é só uma: pedir-lhe que elegam o mal menor. E o mal menor é o tal manequim da rua dos fanqueiros - que dantes corria que nem lebre, e fazia 100m em breves ss. Com efeito, a actual conjuntura de globalização competitiva - que mudou a natureza das coisas, exige, acima de tudo, rapidez e adaptabilidade dos perfis, dos homens e das decisões. E certamente que o dr. Soares não preenche esses requisitos. Será que não dá para votar no Rafael Bordalo Pinheiro????
PS2: agradecemos também à autora destas cartas - que nos chamou a atenção da sua paternidade. Ainda me lembro quando o amigo e mestre Agostinho da Silva publicava os seus livros e colocava, como condição prévia aos respectivos editores, não ter de receber nenhuns direitos de autor. Acho curioso estes contrastes, salvaguardadas as devidas distâncias, mas também aqui encontramos um sinal dos tempo$.