quarta-feira

Os Açores e as pessoas.. (II)

  • Depois das vacas - as pessoas. Pessoas com alma, força, coragem. Pessoas sem leite. Os açoreanos são tudo isso e muito mais.

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Ruisinho:

  • Percebi perfeitamente a tua observação: então, vais aos açores e em vez de falares dos açoreanos, falas das vacas? É o que se chama de observação pertinente e, no entanto, acredita, não se tratou de nenhuma opção que tenha feito. Instintivamente falei das vacas porque quando se visita os Açores, nas condições em que me foi dado visitar, é muito difícil falar dos açoreanos. E entre falar das hortenses ou das paisagens ou do excelente queijo ou do estupendo vinho da ilha do Pico, falei das vacas…. porque elas são omnipresentes, polvilham as ilhas, decoram-nas, embelezam-nas, salpicam-nas, quando vistas de longe, de pontinhos a preto e branco. Não fora a história dizer-nos que os Açores foram povoados pelos portugueses no fim do século xv, e eu era capaz de dizer que tinham sido as vacas a povoá-los, não fora a impossibilidade da expressão povoar.
  • É que, tirando as pessoas que encontramos nas cidades, e essas são mais ou menos todas iguais, as outras, muito pouco as vimos e não tive oportunidade de meter conversa com elas… tudo muito rápido, tudo a fugir. Mas ouvi falar delas e daquilo que tem sido as suas vidas ao longo dos tempos. Confinados àqueles espaços tão limitados, viveram sempre acossados: pelos piratas, primeiro, pelos tremores de terra e pelos vulcões, sempre, por uma população que se reproduzia sem esperança, destino ou futuro, na qual, dar o salto, não era atravessar uma fronteira, de noite, fugindo à Guarda Fiscal e ir por esse mundo fora à aventura, o que já era provação demasiada. Para os açoreanos, dar o salto, era atirarem-se ao mar, de noite, nadar até aos navios baleeiros americanos, subirem sem serem vistos, esconderem-se e depois de descobertos trabalharem um ano para pagarem a viagem. Curvo-me respeitosamente perante a memória desses meus compatriotas, de quem não sei que mais admirar, se a coragem ou o desespero. Mas a regra eram saídas em grandes grupos a seguir a terramotos ou a vulcões em actividade que, desta forma, funcionavam como molas que despoletavam a emigração, uma vezes orientada pelo próprio governo, como aconteceu para o Brasil, onde desempenharam papel importante na colonização e defesa daqueles territórios, ou por sua iniciativa, para os Estados Unidos, Canadá, África do Sul e até Austrália onde as coisas correram mal. Em todos estas paragens constituíram comunidades que honraram os Açores e Portugal.
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  • Estes foram os açoreanos de então. Os de hoje têm, felizmente, a vida bem mais facilitada, com todas aquelas vacas felizes desfazendo-se em leite e enquanto conseguirem manter as cotas leiteiras da Comunidade Europeia.
  • Tal como aconteceu quando fui à Madeira também aqui, por poucos minutos, meti conversa com um motorista de táxi, que são assim como uma espécie de porta vozes das populações. Os primeiros desabafos são sempre os mesmos, contra as excursões organizadas que metem os turistas em camionetas e não lhes mostram os locais bonitos porque não conhecem e só os querem é enganar. Eles sim, verdadeiros conhecedores, mostrariam tudo quanto haveria para ver e a preços muito inferiores.
  • Ouvi-o em silencio, acenando com a cabeça afirmativamente, e quando se calou respondi-lhe que era “ o sistema” . Ele deve ter gostado porque logo de seguida despediu-se de mim dizendo: Adeus Rapaz….ai…há tantos anos que não se despediam de mim assim que mesmo sem corrida tive vontade de lhe dar uma gorjeta…
  • Quando voltar aos Açores, e gostaria de lá voltar, iria para o Faial, escolheria a 2ª quinzena de Julho para apanhar as hortenses floridas, instalava-me em qualquer lado, e durante 15 dias repartia o meu tempo pela ilha do Pico, atravessando o canal numa viagem de ½ hora que mais se assemelha à do cacilheiro para a outra banda, tomaria banhos nas piscinas naturais, visitaria, talvez, a Graciosa e S. Jorge que estão ali pertinho, arranjava uma cana de pesca e ia pescar, e se conseguisse um parceiro para jogar ténis seria o ideal…ah…e iria tentar encontrar o motorista que me tratou por rapaz para ter com ele uma conversinha de pé de orelha para saber coisas dos açoreanos
Fim de Viagem.

Xau. Boa noite
Tio Quim

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